segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Bom dia

Pra mim o amanhecer é o suficiente pra crer.
O engraçado é que os meus olhos são um bocado sensíveis e se eu me exponho ao Sol sinto um pouco de dor.
Mas eu sou mais que esse corpo... Tão mais.
O amanhecer, o Sol apontando no horizonte oficializam pra mim uma nova chance, um novo começo, uma nova vida.
Curitiba deu uma trégua hoje, só pra variar, e deixou o calor nos visitar.

20%

"... retirando do horizonte profano da vida a matéria prima que será sacralizada..." (Padre Fábio).

Próximo ao Departamento de Eletrotécnica tem alguns bancos que viraram conhecidos meus de tanto freqüenta-los.
Certa vez, enquanto esperava minha vez de falar com algum professor, o André Carioca veio se sentar ao meu lado...
Papo vem, papo vai, ele me solta essa:
- Quando eu estava na carreira militar, lembro que se algum dos caras dizia que não agüentava mais durante os
exercícios, o Sargento respondia "quando você acha que não dá, que chegou no seu limite, é que você consegue mais 20%".
Aí, foi embora. Simples assim. Deixou essa bomba na minha mão e saiu correndo.
Essa é uma daquelas coisas que me chamam a atenção, mas que eu também não entendo. Como de costume, separei um
lugar na memória e guardei numa gavetinha, lidaria com ela quando tivesse tempo e alguma noção do que fazer.

Trabalhar oito horas por dia e encarar a Engenharia foi uma péssima idéia, havia noites que eu dormia três horas
porque tinha que fazer os trabalhos, outras ainda, que eu não conseguia dormir de ansiedade. Sair da cama era um
sacrifício e eu estava sempre cansada e impaciente.
Fiz amizades bastante interessantes nesse período, o Padre Fábio tem uma frase que eu adoro, ele diz
"interessantes as amizades que a gente faz a partir da precariedade". Conheci a melhor delas no espaço de três quadras
da casa da minha mãe até o ponto de ônibus, uma senhora que nunca me disse qual era o seu nome e tão pouco perguntou o
meu.
Eu aconheci numa manhã bem comum a minha vida, quando saí de casa meio acordada, meio dormindo, atrasada, aos
trancos e barrancos, afundando e emergindo dos vales que eram os buracos daquela rua. A senhora já estava no ponto, mas
me viu e resolveu voltar e me ajudar.
Na ânsia de me ajudar, ela agarrou no meu braço e começou a me arrastar, desembestou a falar [coisas que eu não
lembro], como ela era mais baixa que eu, eu andava inclinada e, ao invés de entrar e sair dos buracos passei a tropeçar
em todos eles.
Quando chegamos no ponto de ônibus, eu não sei qual era a minha cara, mas ela me largou e riu timidamente e disse
"bom dia"...
Eu estava emputescida.
Mas alguma coisa que eu não sei nomear naquela mulher, no seu jeito simples, conseguiu cativar alguma coisa dentro
de mim. E, por debaixo dos meus nervos se aflorando, alguma coisa insistia em emergir e eu decidi não segurar.
Abri um sorriso enorme e disse o meu "bom dia" em troca do dela, agradeci pela ajuda enquantoarrumava a roupa que
ela havia tirado do lugar e puxei conversa, fui sincera ao dizer que se não fosse ela eu com certeza perderia o ônibus,
então passamos a falar mal daqueles que achávamos que eram responsáveis pelos buracos e pelo asfalto mal acabado.
Quando entrei no ônibus aquele dia e me sentei, lembro de ter pensado "põe vintinho na conta, Carioca Maluco...
põe vintinho na conta".

Palavra de mãe é foda

"... não é o quão forte você bate, é quanto você apanha e consegue ficar de pé..." (Rock 4).

E aconteceu que eu tive um dia ruim.
Foi antes do casamento, na época da faculdade. Pisei numa poça e tive de ouvir uns desaforos no caminho do
trabalho, soube de más notícias na empresa que trabalhava e na universidade. À noite, quando cheguei em casa, eu estava
destruída.
Como naqueles tempos o cansaço e a rabugentisse vinham sendo comum ao meu comportamento com a minha família,
resolvi ao menos aquele dia, poupá-los da minha má companhia e ir direto para o quarto.
Duas características que são inerentes da minha querida mãe foram fundamentais para o meu crescimento pessoal
naquela época: ser insuportavelmente otimista e a única a não ter medo de mim quando eu estava mal humorada.
Eu estava sentada na cama, ela se sentou ao meu lado e tentou arrancar de mim o que havia me deixado naquele
estado, eu pensava lá com meus botões "a vida", mas não tinha coragem de dizer, como eu não me abria, ela limitou-se a
aconselhar:
- Eu não tenho idéia do que aconteceu com você, mas pra eu te deixar em paz, me promete uma coisa, promete pra mim
que quando você colocar a cabeça no travesseiro você vai agradecer. Mas tem que agradecer de coração! Não adianta falar
da boca pra fora. Porque eu tenho certeza filha, por mais difícil que tenha sido o seu dia, você não estaria aqui do meu
lado se coisas boas não tivessem acontecido também. E eu sinto, do fundo do meu coração, que você é uma pessoa
abençoada. Promete pra mim? Promete que aí eu vou embora.
Eu precisava ficar em paz, só por isso eu prometi, uma promessa que eu não intencionava cumprir.
Quando, enfim, ela desistiu, fui me arrumar pra dormir. O sono simplesmente não vinha... Palavra de mãe é Foda.
Ora, eu não tinha nada a perder mesmo, então comecei a pensar em coisas que eu realmente gostava, pelas quais eu
era grata e, cada vez que eu fazia uma descoberta vasculhando minhas lembranças, também agradecia.
Eu não sei quanto tempo demorou, mas eu dormi tão bem.
No outro dia não aconteceu absolutamente nada de diferente. Nada! Não pisei naquela determinada poça, mas pisei em
outra; não ouvi aquele determinado desaforo, mas ouvi outros; mais más notícias; mais gente grossa; mais chapuletadas da
vida.
O diferente é que no final, quando a noite chegou, era eu. Eu não estava destruída, nem irritada, muito pelo
contrário, de repente as dificuldades passaram a ser engraçadas.
E os dias se prosseguiram do jeito que tinham de ser, mais uma vez, mais um dia, mais batalhas, mais vitórias. E
de novo e de novo a vida em mim conseguiu vencer a realidade que a existência me impunha.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Texto encomendado

O NAPNE da UTFPR está desenvolvendo projeto "Pensando a Inclusão", fui convidada a escrever um dos textos, que
segue.

A inclusão, por seus próprios sujeitos

Os meus olhos vinham adoecendo a algum tempo antes de ingressar no curso de Engenharia Elétrotécnica no CEFET -
hoje, UTFPR -, passei no vestibular com 30% da visão e sem a mínima idéia de que era deficiente visual, na minha leiga
concepção eu só estava doente. No segundo ano, após o primeiro transplante de córnea, perdi o pouco de visão que tinha.
Fiz a reabilitação no Instituto de Cegos do Paraná, lá aprendi a usar bengala, ler e escrever em braile e tive as
primeiras noções de informática.
Daí em diante as coisas aconteceram todas juntas. Por exemplo, a primeira vez que saí andar de bengala sozinha,
foi para levar os documentos para o reingresso na faculdade e, depois, as aulas mais avançadas de informática foram
propiciadas graças ao contato de um dos coordenadores do Departamento de Eletrotécnica, na época, Professor Ivan
Colling, com o centro pedagógico do estado.
É engraçado recordar o período de reingresso, eu e os professores não sabíamos ao certo o que estávamos fazendo.
Porém, de novo o Professor Colling descobriu que o Professor Rubens Ferronato (UNIPAN, Cascavel) havia obtido sucesso ao ensinar
cálculo diferencial integral a alunos cegos. Atendendo ao nosso convite, ele veio até Curitiba e tivemos uma reunião com
meus três primeiros professores. Além da orientação, ele também nos apresentou ao Geoplano, invenção dele, com o qual eu
fui capaz de compreender gráficos e diagramas.
Também utilizei outras ferramentas Para acompanhar as aulas: um gravador digital, computador com sintetizador de
voz, digitalização de livros e inúmeras reuniões com cada professor para sanar as dúvidas.
Além das disciplinas que cursei, aprendi também a valorizar profundamente o poder das palavras, compreendi que
quando a iniciativa tem a possibilidade de começar a partir de um diálogo sereno, firme e inteligente, a expectativa das
coisas terminarem bem são muito maiores. Contudo, quando o diálogo não foi possível, quando ouvi "tudo bem, mas não vou
levar ninguém na faculdade" e fui chamada de "fraude", percebi que devia desenvolver a capacidade de agradecer a opinião
dos meus interlocutores e seguir em frente.
Se de um lado recebi apoio dos meus primeiros professores e dos coordenadores da Engenharia e do Departamento de
Eletrotécnica, também fui desestimulada por familiares, amigos e deficientes visuais muito mais experientes que eu.
Eu me divirto toda vez que recordo da minha conclusão: como não houvesse precedente de um cego cursando
Engenharia, eu, aqueles que me apoiavam e aqueles que me desestimulavam éramos todos iguais em nossa ignorância; logo,
eu estudaria aquilo que gostava e escolhera; e, enquanto eu tivesse o apoio de outros Engenheiros, eu ainda tinha uma
réstia de esperança e isso me bastava.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Terapia diária

"Com quem você quer falar por horas e horas e horas?" (Renato Russo).

O valor de uma palavra amiga é coisa que não devia ser subestimado. Em muitas vezes que precisei, sem aviso nenhum, tive conversas que me proporcionaram uma força que não sabia que tinha.
Em contra partida, em momentos de fragilidade, também ouvi barbáries de pessoas próximas o suficiente para me machucar profunda e permanentemente.
Em cima do muro, sempre tem aquele que simplesmente não sabe o que dizer. Naturalmente, afinal, o caminho que escoli não compõe uma paisagem comumente desejada.
Infelizmente isso me deixou um tantinho confusa, vez em quando eu entrava num ciclo vicioso de tristeza, tateando alguma esperança na minha lista de telefones, mas pra quem ligar? Cada ser humano está ocupado com o próprio crescimento, com a evolução pessoal. E não dá pra exigir que outro ser humano, tão humano quanto eu, seja capaz de me decifrar e me dizer o que preciso ouvir quando preciso ouvir.
Aí, eu decidi a escrever assim de sopetão, uma terapia alternativa pra emergir de vez da tristeza. Filosofia de "faça você mesmo". Acho que está a caminho de dar certo... Às vezes ainda tenho que recorrer a outras leituras, mas escrever tem me feito bem.

De todos os motivos que guardo cá comigo pra gostar de Jesus Cristo, o meu encanto maior é com a gentileza. Não aquelas gentilezas vindas da boa educação, não daquela educação que mamãe ensina, não das palavrinhas mágicas. É a mágica da aproximação, da capacidade de chamar pra perto, de aconchegar, de abraçar com tudo o que tinha no pacote, com os defeitos, com as feridas, imoralidades e o que fosse.
Eu fico pasma toda vez que leio os Evangelhos, pasma e satisfeita, mesmo que existam tantos pregadores, tantos livros e documentos dentro da Igreja... Quando o meu coração aperta e não há jeito de respirar, é lá junto de JC que eu me aconchego.

domingo, 21 de agosto de 2011

E a luz se apagou

Sabe que não cei a data, não sou médica e não sei qual é a norma da
ANVISA para conceder um cidadão legalmente cego. Só me lembro de
quando a médica disse "eu já falei pra você pegar a bengala", lembro
de ter pensado "não disse não"... e que doeu.
Minha mãe estava comigo, o consultório da médica fica em São Paulo,
capital, nós moramos em Curitiba, longe, e há um bom caminho de volta.
Lembro de absolutamente nada. Nada de paisagem. Nada do que agradecer.
Nada do que reclamar. Nenhuma palavra. Nenhum pensamento. Nada.
Combina com a escuridão.
Observação canalha, eu nunca fiquei na escuridão, vejo a luz e
contrastes de cores - a lesão no nervo ótico ao invés de fechar um
manto negro de fora pra dentro como era de se imaginar, abre como um
lençol branco de dentro pra fora. Tentei ser um tantinho poética.
Também não lembro de quase nada daquele período. O pouco que guardo é
cheio de muitos consultórios médicos, muitos remédios, cirurgias e
dor.
Lembro também de todos os dias tentar mirar o meu guarda-roupa,
ficava bem em frente a minha cama e notar o avanço do glaucoma.
Fui declarada oficialmente cega por minha médica bem quando terminou
meu período de experiência do emprego novo. Como ainda via um tantinho
e percebia o avanço da doença, procurei guardar comigo cada detalhe
das feições das pessoas que me acompanhavam. Lembro de cada poda que
sofri, comecei fazendo cartas e aproximando bastante o monitor e a
folha de papel para poder enxergar, depois da lente de aumento do
Windows e, final mente, do sintetizador de voz do computador. Algo eu
também tenho ainda fresco na minha memória, quando meu chefe disse "eu
não sei o que fazer com você, te aposentar eu não posso, só você
pode".
Quando completou um ano do trancamento da faculdade de Engenharia
Elétrica, decidi voltar, Ah, disso eu lembro de tudinho, tudinho! Cada
reunião, cada professor, cada matéria. tudo.
Eu ainda não entendi completamente o porquê da Engenharia ter tanta
importância na minha vida, mas tem. Vou tentar explicar tanto quanto
meu auto conhecimento já conseguiu alcançar.
Eu não consegui vencer a cegueira, ela tomou conta de mim, cada vez
que penso sobre o progresso dela, toda vez, o que me vem é uma criança
jogada numa correnteza negra e fria. Ninguém me ensinou a nadar,
ninguém me disse como lutar. Aquela coisa foi me puxando e meus
pequenos braços e pernas não foram suficientemente fortes para
conseguir me manter... Bem... Viva.
Eu tive que nascer de novo.
Então, eu me encontrei uma mulher de 20 anos, cega, numa família com
quem eu não conseguia me comunicar, num emprego onde não me queriam,
órfã de amigos, com um sonho pela metade nas mãos.
Eu me agarrei com unhas e dentes na única coisa que me pareceu sólida
no momento, foi tudo o que eu pude enxergar, foi tudo ao que eu me
apeguei, passou a ser tudo com o que eu me importava.

Questão de referencial

"Uma partícula é como a poesia, ambas carregam muito ainda que pequenas" (Professor Colling)

Montanhas, Física e Poesia

Sentada numa mesa de bar pergunto:
- O que é que tem do outro lado da rua?
- Carros estacionados e gente andando na calçada.
- O que mais?
- Bem, tem os prédios também.
- De quantos andares eles são?
- Não sei, daqui não dá pra ver.
- Saindo, dá?
- Ah... sim...
Achei graça.
Dá pra ter noção do tamanho de uma placa vendo de perto, de um carro, até de um prédio... de uma montanha não dá, os olhos não alcançam, isso às vezes se
torna possível se a gente se afastar o suficiente pra fazer a montanha caber no campo de visão.
Com as pessoas parece à mesma coisa, a gente só tem noção de quanto elas são grandes de longe, depois que a gente se afasta.

O Professor Colling foi meu professor predileto na Engenharia por vários motivos, mas o principal deles é que ele parecia tão apaixonado pela Física quanto eu.
A paixão sempre me pareceu igual, infelizmente, a relação não, a relação dele com a Física está para casamento, tanto quanto a minha está para amor platônico.
E nós dois fizemos a mesma Engenharia Elétrica.
Ah, a Engenharia! Ah, a Eletricidade!
A manipulação da Eletricidade é uma descoberta formidável: uma queda d'água tem uma Energia Potencial dada sua altura, massa de água e força da gravidade, a massa e a gravidade são as mesmas, porém, quanto maior a altura, maior também a velocidade, a velocidade da queda de água movimenta uma turbina ligada a um gerador... é aí que a mágica acontece! E essa é só a Energia Hidráulica!
Do gerador até a minha casa a Força Eletromotriz caminha por cabos, é manipulada por transformadores, são toneladas de metal, material eletromagnético e isolante. Sem contar na quantidade de pessoas envolvidas.
A mesma Energia Potencial devido à altura de elevação da água do reservatório é aquela que movimenta as hélices do meu ventilador, que esquenta as resistências do meu aquecedor e do meu chuveiro, carrega a bateria do meu celular, sustenta o acionamento e funcionamento dos meus aparelhos eletrônicos...
Nossa... é... de... mais.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Continente


Rosas, produto notável, nariz operado

Descobri um negócio chamado "horóscopo das flores" quando procurava a ligação entre flores e olhos, estava procurando porque, seja em minhas orações, seja durante a acupuntura ou em um insite ou outro no meio do dia, a figura de uma flor me vem quando penso em meus olhos. Nesse horóscopo é dito que, a partir da minha data de nascimento, da cor dos meus olhos e cabelos, eu me enquadro no perfil de rosa romântica...
Acho que seja lá quem for o tal que o escreveu não gosta muito de rosas românticas...
Para esse perfil o autor se limitou a escrever "você está sempre procurando alguém para colocar a culpa".
Essa porcaria não é o que se possa chamar de oração da sabedoria, mas, fazer o que, como sempre, eu tenho que pensar.

Ajudei o meu irmãozinho com matemática no último final de semana, ele tinha encalhado em três exercícios que nem ele nem o povo de casa conseguiam resolver, como eu estava de visita, ele aproveitou para sanar as dúvidas.
Foi bem legal.
Gosto de números, são simples, a solução é sempre óbvia. Óbvia no sentido de que se existe, existe; se não existe, não existe. Simples assim.
Entre eu e meu irmão a comunicação precisou da ajuda de papel e lápis. Ele me ditava os exercícios e eu os escrevia num papel pra ter certeza de que o que ele dizia era o que eu entendia. E vice e versa.
Entre eu e a matemática rolou a mesma mágica de sempre. Repassava as expressões mentalmente algumas vezes, eram todas de produto notável, desvencilhava os números de cada uma aos poucos, então não era mais uma expressão, eram peças de uma expressão, rearranjei tudo na minha cabeça, fiz as simplificações e pronto, resolvido.
Penso que tento fazer o mesmo com tudo na vida: absorvo as informações, não importa de onde venham, e, se elas produzem uma interrogação, eu as mastigo, mastigo, retiro o que me faz mal, levo comigo o que me faz bem e, quando não
compreendo, guardo numa gaveta para lidar com elas depois.

O maridão operou o nariz, minha sogra foi conosco para o hospital e passou o resto do dia em nossa casa.
No final da tarde eu comecei a azedar de um jeito...
Estava me sentindo cansada, mal humorada, irritada.
Minha sogra me chamou para tomar café, eu estava no sofá pajeando o marido e fui pra mesa, quando sentei, não me agüentei e disse "nossa, por que é que eu tô tão irritada?!", na mesma hora ela respondeu "é por causa do hospital, a gente fica assim mesmo".
Engraçado que nesse momento eu vi minha mãe, lembrei das viagens e cirurgias, da corrida procurando oftalmologistas em tudo quanto é lugar, em outras cidades, em outros estados... Ocorreu-me que eu nunca a agradeci direito, pior, eu a usei por um bom tempo como bode espiatório da minha mágoa por ter perdido a visão.

Ainda não sei direito porque esses eventos me chamaram tanto a atenção, nem porque quando penso em um, os outros me vem, mas sinto estar descobrindo um continente inteiro de percepções em mim, queria que a vida fosse tão fácil como a matemática, assim eu alcançaria com uma simples reorganização de raciocínio o que é que dá pra cancelar e chegar de uma vez no resultado final, seja lá qual fosse.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

A cor do blog

Engraçado... estranhamente tem um monte de coisas sobre as quais eu gostaria de escrever, quando que a tão pouco
pouco tempo estava tão difícil, aí, fiz uma triagem nos posts publicados e fiquei impressionada com que encontrei: juro
que via parede do quarto da minha irmã - listradinha em tons de roxo e rosa.
Eu não lembro qual foi a aparência que escolhemos pro blog, levando em conta a deficiência visual também não dá
pra comprovar... mas se eu fosse combinar minhas impressões dos posts, mais um bocadinho da minha personalidade, mais
outro bocadinho das idéias que me ocorrem, mais um outro ainda das influências externas, usaria algo com flor de
serejeira... sabe, aquelas rosinhas.
Rosa chá! Violeta! Lilás..?
Será
Misto de experiência e descoberta.
É mais ou menos assim a Eu de agora, uma coisinha confusa com um quê de meiguisse... um quê de revolta.
Ou não...
Ah, e, a propósito, estava cogitando "ou não..." como nome alternativo para o blog.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Canta pra mim

"Lálálá" (Maridão)

Eu fiz esse caminho a vida toda, todos os dias as mesmas ruas, toda vez o mesmo parque. Sei de cada lombada, cada
curva, conheço todas as calçadas. O comércio nunca mudou, o mesmo jornaleiro, a mesma fornada de pão, as mesmas
crianças, todas, todas iguais.
Bem aqui, de tostão em tostão, eu gastei toda minha vida.
Então você me aparece numa esquina qualquer, o seu som só ecoa, lá longe e, com que insistência irritante, a
música me invade os ouvidos em versos desconexos e de tom em tom ganham forma.
De repente nenhuma forma é mais desbotada.
De repente, de um bléim pra outro mesmo, a cor meio que salta aos olhos, tudo se aproxima, a rotina ganha cheiro,
o dia ganha brilho.
Canta pra mim, canta, porque te ouvir cantar é rever minha história.
Canta pra mim, canta, porque te ouvir é sentir um tesão que eu não lembrava que tinha.
Canta, canta pra eu sorrir com as lembranças velhas.
Canta pra eu cair na nostalgia, pra eu recordar do que se foi com vida, pra eu rever minha juventude em cores
vivas.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Parla!

"Ele não quer mais ser o Flash!" (A creche do papai)

Tenho juntado uns retalhos cá comigo que acho que já dá pra costurar.

O primeiro e maior retalho eu colhi no filme "A creche do papai", estrelado por Edie Murphy, lá tinha um piá que
não tirava a fantasia do Flash de jeito maneira, ele estava convencido de que era o próprio e passou assim a maior parte
do filme, quase no final o "Flash" some da creche e todo mundo começa a procurá-lo feito doidos, super preocupados,
então encontram um moleque só de cueca na cozinha comendo cereal, perguntam o nome dele e ele diz que é Fulano [não
lembro o nome mesmo], um dos caras se recordou que Fulano era o nome do Flash, quando perguntam pra ele se ele é o
Fulano-Que-É-O-Flash, ele responde que não quer mais ser o Flash.
Eu me encantei com essa idéia de um jeito.
Eu ainda não aprendi a explicar direito, mas eu acho que é bem assim que o Amor acontece.

O contrário, eu li em "O fantasma da ópera", o contrário porque o protagonista também usava máscara, o nome do
fantasma era Erik, ele foi deixado de lado desde que nasceu porque era feio, ele também era um gênio, um músico, um
engenheiro, arquiteto, compositor. Acabou que fez um monte de barbáries, matou gente e acabou ganhando a redenção com a
compaixão de Cristine. A frase que mais me chamou atenção no livro foi "Mau, Cristine? Mau? Para eu ser bom, eu só
precisava ser amado".
Eu não sei como funciona o processo do medo, mas eu sei que a gente se esconde quando é esse o sentimento.
Eu não sei como funciona o processo da maldade, mas eu sei que a gente a carrega dentro do peito e que ela só
cresce se for alimentada e que, como tudo o que é forte, precisa ser nutrida pra ser libertada.
Eu sei também que quem sente medo e raiva cansa. E todo que cansa precisa de colo, precisa de berço, precisa de
abraço.

Amor, acho que é escolha que tem que ser ensinada, é uma opção, uma coisa que agente constrói quando está em dois
ou mais, uma obra de arte pintada com jestos de compreensão e acolhida.
Não gosto nenhum pouco da idéia de química mistrurada ao Amor, química acontece sem pedir licença, Amor é manso, é
educado, pede licença e precisa da nossa permissão.
Não gosto da idéia de natureza misturada ao Amor, natureza pode ser atrapalhada por nossa interferência mas não
precisa dela, Amor precisa ser ensinado.
Uma vez eu estava na casa de uma das minhas madrinhas de casamento, fui conhecer a filhinha dela que tinha acabado
de nascer, eu não sei direito o porquê, mas a bebê sofre com cólicas toda vez depois de mamar, quando a menina começava
a se contorcer e chorar, minha amiga falava "eu sei, eu sei, a mamãe sabe, tudo bem, tudo bem", Acho que a imagem de uma
mãe acolhendo com carinho e paciência o filho que chora no colo é a obra máxima do amor.

Fui presenteada com outro retalho escutando rádio, o João Bosco falou a respeito do processo de compor... às vezes
quando me lembro, parece mais que ele falou a respeito de baixar o santo, mas tudo bem, essa impressão não vem ao caso.
Ele disse que a primeira coisa que o músico tem que fazer é trabalhar a técnica, estar com a habilidade no violão bem
treinada, estar com a voz bem com as oitavas [seja lá o que isso quer dizer], então, no momento que ele menos espera,
essa coisa bonita vai se deixar brotar através dele feito olho d'água, vai querer aparecer, não vai mais querer se
esconder, e a obra acontece.
Penso que a habilidade em lidar com as pessoas não seja assim tão diferente do artista. Muda a matemática só, ao
invés de ser um, são dois.
A gente conhece aquele alguém e alguma coisa dentro da gente se sente convidada e a vontade por alguma coisa no
outro, de repente, essa coisa que estava guardada se mostra e não quer mais se esconder.
Numa outra parte da entrevista, ele disse que depois de chegar ao final da composição de uma música, "a gente se
sente brilhante", eu achei graça, porque quando eu me lembro das pessoas que eu mais gosto, é como "brilhante" que eu as
recordo.

um escritor que infelizmente [infelizmente mesmo] eu não lembro o nome disse em um de seus livros "se eu te
mostrar minha nudez, porfavor, não me faça sentir vergonha"... e quando a gente se mostra, nem sempre é bonito de se
ver... e às vezes o que parece feio, é sugeira só que limpa fácil com algumas lágrimas... e como tem beleza enterrada no
lixo nesse mundo... e como a gente tem que estar com o coração afiado pra que, quando a beleza apontar no meio do lôdo e
se sentir pronta pra se mostrar, a gente esteja pronto pra receber.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Enfim... um adeus

Eu não sei o que é que eu tenho... mas adeus.
Um pedaço aqui dentro não quer mais existir, sei lá o nome que ele tem... mas adeus.
Isso me dá uma calma, devo estar trocando de pele, e deve ser pele mesmo, porque já parece morta, só esperando eu
a deixar.
Mas sabe que eu preciso de ajuda, porque tá tão difícil de deixar, tão difícil continuar... ah, vai... mas, ainda
que difícil, adeus.
Já tá na hora de deixar pra lá, já é hora de esquecer, hora de deixar morrer pra deixar viver.
Adeus ontem, adeus saudade.
Adeus, chega de desejar, chega de amargar.
Chega de amar-gar, chega de amor-tecer, chega de espectativas doentes, chega de doença, chega de veneno, chega de
pequeno, chega de criança, chega de infância.
Enfim, adeus... hora de crescer.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Vontade de amor, vontade de amar

Engraçado esse jeito de aprender, esse jeito meigo que a beleza da vida tem de transparecer, essa doçura que as
manhãs me oferecem, o sabor das convivências , das amizades.
Engraçada a gentileza da exixtência, toda a paciência, toda a tranquilidade... o meu raciocínio é lento, eu
preciso de tempo, e essa vida professora é insistente e me afaga a cada lição.
Hoje, eu me flagrei mimada, eu me encontrei afagada pelas carícias do tempo, eu ouvi o dia amanhecer sussurrando
"vamos, querida, mais uma vez... calma, você pode, você consegue, mais uma vez".
O cheiro do lençol, o som da cidade, o teto protetor, o homem amante, os cobertores, o aroma do café quentinho...
ah, o ar! Ah, o ar!
Hoje acordei com vontade de amar.
Abri os olhos e tudo pareceu tão mais lindo.
Ah, Deus, se você pode me ler!
obrigada! Obrigada por tanta beleza, obrigada por tanto amor, obrigada por tanta paz!